segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

O DRAGÃO RODRIGO - Peça em 3 atos e 8 cenas - Para crianças e alguns poucos adultos


Olavo Cabral Ramos Filho - (2002-2005)



Personagens por ordem de entrada:
- 5 soldados
- Dragão-bebê
- Dragão-mãe
- Monge Bedezeu
- Monge Patricioto
- Chefe Viking
- Dragão-avô
- Capitão Diogo Cão
- Mestre Zacuto
- Ator 1
- Glocester
- Marinheiro
- Rodriwin (dragão adulto)
- Índio 1
- Índio 2
- Olavinho
- Babá
- Muitos índios, índias, curumins
- Muitos homens brancos

Primeiro Ato
Cena 1
Uma praia da costa nordeste da Inglaterra, com rochedos. Um grupo de cinco soldados saxões armados, com cotas de malha e indumentárias coloridas. Avista-se ao longe uma igreja. Ano 793 da era comum. Raios e trovões no horizonte
Soldado 1: Há oito ou nove gerações estamos nesta ilha. Alguns sinais começaram a aparecer prenunciando tragédia.

Soldado 2:
(Apontando para a igreja) O monges de Lindsfarne estão inquietos. Rezam noite e dia.

Soldado 3:
Ouvi de um monge astrônomo, que passa as noites na torre, que já viu dois cometas e a explosão de uma estrela no céu.

Soldado 4:
( o mais velho com longas barbas) : Quando lutamos contra os galeses nas terríveis montanhas do oeste, prendemos um estranho velho sacerdote que dizia ter 200 anos. Dizia que os maiores portentos que anunciariam desgraças seriam dragões chegando do leste.

Soldado 5: Por São Jorge, como vamos fazer se eles forem carnívoros?

Os cinco Soldados em côro: Acontecerão há qualquer momento coisas terríveis, assustadoras, hediondas, sinistras, horríveis, dantescas, demoníacas, fantasmagóricas, extraordinárias e...e...e...e... dragônicas.

Apontam para o horizonte onde relâmpagos e trovões tornam-se mais freqüentes e violentos. De repente, voando baixo sobre o mar, dois dragões, um maior, dragão fêmea, outro menor, quase um bebê dragão. Voam em círculos sobre a praia. O soldados recuam quando aparecem e fogem correndo.

Cena 2
Os dragões pousam na praia. A dragão-mãe corre atrás dos soldados soltando fogo pela boca. Volta para junto do Dragão-bebê.

Dragão-mãe: Não podemos perder tempo aqui. Temos que chegar ao lago onde vive seu avô há 1000 anos. É mais ao norte, no meio das montanhas onde vive um povo pintado.

Dragão-bebê: Estou muito cansado. Será que o cavaleiro que cortou o pescoço de papai não veio atrás de nós ? Papai disse uma vez que esse lago na terra dos homens pintados era muito frio. Pensei que estávamos procurando um lago em terras mais quentes.

Dragão-mãe: O cavaleiro Uluf tem mais o que fazer. Espero que não venha para cá. Há uma lenda de uma terra no sul onde existe um lago salgado e quente, perto do mar, cercado de colinas azuis com florestas bem diferentes das que conhecemos. Vamos descansar no lago de seu avô e, um dia, voaremos para o sul e o calor.

Dragão-bebê: Estou com fome mamãe !!

Dragão-mãe: Não consegui pegar nenhum desses homens apetitosos. Mas, ainda pegarei um.

Dragão-bebê: Mãe, não gosto da carne dos homens.

Dragão-mãe: Que vergonha . Como vou contar para seu avô que você só come peixe, verduras e algas ? Você ainda vai provar e gostar de um homenzinho bem tostadinho pelo nosso fogo.

Dragão-bebê: Não consegui nunca por fogo pela boca.

O Dragão-mãe entra no mar e pega um peixe.

Dragão-mãe ( dá o peixe para o filho): Toma ai ! Não sei de quem você herdou essa mania de só comer peixe e verduras. Nos somos os últimos repteis voadores deste planeta que os homens nem sabem que é redondo e que gira em volta da estrela sol ( Começa a abanar as asas ). Vamos tratar de sair daqui. Os soldados vão voltar com muitos outros. Seu pai esteve nessas terras há muitos anos e contou-me que um soldado daqui, de nome George, era especialista em matar dragões.

O Dragão-bebê começa a comer o peixe. Mãe e filho voam, rodopiam sobre o mar, e somem no céu. Escurece a cena.

Cena 3
O mesmo cenário. Alguns meses depois. Aproxima-se um longo navio viking cheio de soldados louros e ruivos. Homens enormes. Dois soldados saxões e dois monges escondidos atrás de uma rocha observam os recém chegados. Os dois soldados fogem correndo e gritando. Os homens do norte apareceram. Os homens do norte estão vindo. O monges conversam enquanto saem.

Monge Bedezeu: Nosso superior agora vai acreditar que os cometas, a explosão da estrela e os dragões eram avisos de portentos, tragédias e uma mudança de tudo nessas nossas ilhas.

Monge Patricioto: Nosso superior já nos acusou de heresia, feitiçaria e mágica porque andamos repetindo os ensinamentos dos nossos ancestrais que agora estão escondidos nas montanhas de Gales, no fim da terra e junto com nossos irmãos da Galia.

Monge Bedezeu: Nada disso importa agora (Aponta para a igreja de Lindsfarne) Vamos avisar a todos. A primeira coisa que os gigantes do longo navio vão fazer é destruir nosso mosteiro. ( Ambos saem ).

O navio encosta na praia. Os soldados vikings desembarcam, correm em todas as direções procurando resistência. Como nada encontram reúnem-se em torno do soldado mais gordo. O chefe. Cantam e dançam com os escudos espadas e lanças..

Soldados (barítonos e baixos): Ninguém nos agüenta,
Ninguém nos aguenta,
Celtas, saxões, anglos,
Franceses, russos, alemães.
Até mesmo
Os sicilianos !
Os sicilianos !
Os sicilianos !!
E depois dessas ilhas
Até a Groenlândia e America
O vento na vela venta
O vento na vela venta
Ninguém nos agüenta
Ninguém nos agüenta.

Chefe Viking (Apontando a igreja ao longe com a espada): Todos comigo ! O monges já devem ter escapado. O povo também. Tomem conta de tudo que brilha e de todo trigo. Não esqueçam os barris de cerveja. Tragam tudo para o navio. O resto, queimem tudo. A igreja também. Esse dia ninguém esquecerá nessas belas ilhas. Os vikings saem cantando novamente. O coro continua durante algum tempo. A igreja ao longe começa a queimar. Escurece.

Cena 4
O fundo do lago na Escócia. Dragão-mãe. Dragão-bebê e o velho Dragão-avô estão sentados em diversas rochas, conversando. Passam peixes que são agarrrados e comidos pelos três. O Gragão-bebê é o que tem maior apetite.

Dragão-mãe: ( Para o filho) Não coma tanto. Você não está acostumado com os peixes daqui.

Dragão-bebê: (Dirigindo-se a mãe ) Estou com muita fome. Você não deixou mergulhar naquela praia.

Dragão-avô: Deixa o garoto comer o que quizer. Aqui no lago Ness vivem os mais gostosos peixes das ilhas. São pouco pescados. Todos esses homens pintados tem medo de pescar por minha causa. Tomei gosto pela carne deles. Já devorei mais de 500.

Dragão-mãe: Papai, você deve ter herdado esse gosto dos nosso ancestral Tiranorex. Há muitas gerações só comemos vegetais e peixes. As vezes alguns patos e gansos. Contando essas histórias você assusta o menino.

Nesse momento cai , afundando lentamente da superfície, um cavaleiro de armadura. Afunda tentando voltar a superficie. O Dragão-avô dá um pulo, agarra o cavaleiro esconde-se atrás de uma das rochas. O Dragão-bebê agarra-se a mãe.

Dragão-mãe: Papai ! Não faça isso.

Ouve-se o barulho de gritos. Pedaços da armadura são jogados para todos os lados. Volta o Dragão-avô lambendo os beiços. Cospe um pedaço da armadura.

Dragão-avô: Seriam mais apetitosos se não usassem todo esse ferro. É pior do que espinhas de peixe.

Dragão- bebê: (para a mãe, ainda soluçando) Não quero ficar morando aqui. Quero ir embora oara o lago quente que você me prometeu.

Dragão-avô: Esse garoto começa a me envergonhar ! Ainda por cima você deu-lhe o nome Uther , aquele maldito rei das terras do sul.

Dragão-mãe: (Consolando o filho) Mas temos que ficar aqui com seu avô mais 700 anos.
Escurece

Cena 5
O castelo de popa e parte do tombadilho de uma caravela portuguesa navegando no mar Tenebroso no final do século XV. Vê-se o mar azul com ondas calmas. O capitão Diogo Cão, outros cavaleiros e marinheiros. Os marinheiros sobem e descem pelas escadas de corda. No topo do mastro do tombadilho, um marinheiro olha o mar da cesta de observação. A caravela oscila lentamente, rangendo as cordas e madeiras. Um palco com cortinados coloridos está armado no convés. Atores ensaiam em silêncio.

Capitão Diogo Cão: (com o astrolábio na mão) Já passamos o cabo Bojador. Precisamos registrar nossa posição o mais corretamente possível. O príncipe D. Henrique instrui-me a não errar nos dados para nossas cartas de marear. Temos que ser muito cuidadosos. (Dá o astrolábio para o Mestre Zacuto ).

Mestre Zacuto: Tenho feito muitas medições todos os dias.

Pega o instrumento e pendura-o no tripé para iniciar a medição. Tropeça , cai derrubando tudo. Procura, desajeitadamente, levantar, cai novamente. Os marinheiros riem.

Capitão Diogo Cão: Zacuto, pelas barbas do seu profeta Elias. Esse é um astrolábio caríssimo de prata. Pertenceu ao Califa de Granada. Com ele quebrado as medições vão ficar uma porcaria e outros navegadores nunca conseguirão chegar às Índias. Não chegaremos nem ao fim desta África.(Com voz grossa e enfática) Quem nos dirige é a vontade Del Rei D. João II e de todo um povo que com ele quer descobrir o mundo.

Capitão Diogo Cão: Antes de completar as medições vamos assistir o grupo de teatro que viaja conosco.

Todos se sentam em poucas cadeiras e sobre caixas e rolos de corda. Zacuto continua mexendo no astrolábio. O capitão o repreende com gestos.

Um ator anuncia.

Ator 1: A vida malvada do rei Ricardo III que será escrita algum dia por autor mais genial e será representada – por atores menos ignorantes – Por enquanto contentemo-nos com nossos atores embarcados ( faz gesto de desânimo ) . Distraiamo-nos ( olha os outros atores com gestos de medo) enquanto nossa caravela não caia nos abismos ou seja devorada por monstros.

Abre-se a cortina e aparece sozinho o Duque de Glocester (sic) , pés enormes , uma corcunda tão exagerada como o nariz.

Glocester : Agora o inverno do nosso descontentamento transformou-se num glorioso verão por esse sol de York, e todas as nuvens pesadas sobre nossa casa real são engolidas pelo seio profundo do oceano.

Parece esquecer o texto. Olha agoniado para os lados. Continua.

Glocester: ... Nossas cabeças estão envolvidas por coroas da derrota...

Voz atrás do palco: Idiota !! Coroas da vitória !!!

Glocester: ... Coroas da vitória ! Nossas espadas sem fio penduradas nos monumentos. ... Eu que sou feio sem as graças de um amante, deformado , inacabado, nascido antes do tempo, terminado pela metade...

Voz: Pulou uma parte enorme imbecil !!

Um lança aparece detrás do palco e é enfiada no traseiro de Glocester que sai correndo atrás do agressor. Caos total. O palco despenca. Risos e gritos. Mestre Zacuto, ainda entretido com o astrolábio, é atropelado e cai agarrado a Glocester.

Capitão Diogo Cão: ( tentando restabelecer a ordem) Parem imediatamente....

Nem termina a frase. O marinheiro vigia grita.

Marinheiro: Monstro marinho a bombordo nadando em nossa direção e outro, enorme chega voando.

Os marinheiros, ainda rindo do desastre teatral, ficam estáticos e , em seguida, começam a gritar e correr para todos os lados. Ajoelham-se e rezam em voz alta. As ondas começam a aumentar. O céu escurece. Zacuto se esconde num canto abandonando o astrolábio. Capitão Diogo Cão empurra o marinheiro da roda do leme e segura-a firmemente. O Dragão Rodriwin , agora enorme, sobe na murada da caravela. O Dragão-mãe chega voando, encarapitando-se no castelo da popa.

Rodriwin e a mãe soltam fumaça e depois fogo pela boca. Todos apavavorados menos o Capitão Diogo Cão.

Capitão Diogo Cão: (gritando para os dragões) Não adianta ! Nada tememos ! Porque manda a vontade que me ata ao leme ( corre e segura com força a roda do leme) , Del Rei D. João Segundo ! Del Rei D. João Segundo !!

Os marinheiros levantam-se já sem medo. Até Zacuto segura firmemente o astrolábio levantando-o em direção aos dragões. Cantam todos:

Manda a vontade,
Que me ata ao leme,
Del Rei D. João II
Sumam no mar profundo
Que será todo de
D. João II,
D. João II

Rodriwin e a mãe param de soltar fogo e fumaça, abanam as cabeças entreolhando-se, sacodem as asas e mergulham no mar Tenebroso. Relâmpagos e trovões, ondas ainda mais fortes. Ouve-se a voz de Rodriwin.

Rodriwin: Mãe, vamos embora . Quero chegar o mais rapidamente possível à lagoa quente que você prometeu na terra de Pindorama. Espero que esses loucos nunca cheguem lá.
Escurece. Cortina

Segundo Ato
Cena 1
As margens arenosas da lagoa de Sacopanepã . No fundo os morros que mais tarde seriam chamados de serra da Carioca e o Corcovado. Malocas de índios.
Indios e índias adultos e diversos curumins circulando, entrando e saindo das malocas. Dois índios sentados na margem da lagoa. Na lagoa aparece a cabeça de Rodriwin e , logo depois, do Dragão-mãe.

Indio 1: (olhando a lagoa e ficando em pé sem mostrar susto, alertando todos) Olhem lá ! Os espíritos do mar estão entrando na lagoa novamente como no tempo em que a lagoa era mar.

Indio 2: (abanando os braços para os dragões, acompanhado de todos, inclusive dos curumins; berra) É a profecia. É a profecia. Eles vão nos contar muitas coisas

Todos dançam. Rodriwin e a mãe saem lentamente da água. Sentam na areia das margens da lagoa. Todos dançam em volta. O Índio 2 canta.

Indio 2: Saco, saco, panepan
Saco, saco, panepan
Saco, saco, panepan
Ipa, Ipa, Ipa , nema
Ipa, ipa, ipa, nema
Copa, copa , na cabana
Copa, copa, na cabana

Todos cantam juntos. Rodriwin e a mãe soltam fogo pela boca. Todos param . Silêncio.

Rodriwin: ( um tanto tímido) Obrigado , obrigado.......

Dragão-mãe: ( cutucando o filho) Fala direito. Como prometi, aqui estamos longe do frio. Temos que agradar essa gente que não se assustou. Conta o que vimos no mar tenebroso.

Rodriwin: ( Segurando e torcendo o rabo) Bem , bem.... Estamos chegando de muito longe. Voamos muitos dias. Bem, bem..... ( a mãe o cutuca co força) Queremos morar nessa lagoa . Ela não é tão funda quanto o lago muito frio de onde viemos. Acho que tem peixe para todos na lagoa e no mar logo ali. ( dá um arroto com fogo e fumaça ) . Desculpe , desculpe....

Todos cantam: Saco, saco, panepan
Saco, saco, ipa, ipa
Copa, copa, nema, nema.

Índio 2 : ( pela plumagem parece ser o mais importante) Sempre os esperamos. Há mil luas a profecia era sabida. Com vocês teríamos finalmente paz com nossos 5 milhões de irmãos em todo Pindorama. Pindorama seria finalmente o paraíso.Podem ficar para sempre na lagoa, no mar , até na ilha branca das cagarras das gaivotas.

Dragão-mãe: Mas temos uma noticia que pode desmentir uma profecia tão boa. Quando voamos sobre o mar, encontramos um navio cheio de homens muito branquinhos, mas muito mau cheirosos. Depois de perder o medo gritaram que o mar era do rei deles. Rodriwin comentou que esperava que eles nunca chegassem aqui. Era um navio só. Mas , de onde vimos, sabemos que quando eles saem num navio, atrás virão mil navios.

A noite chegava. O céu foi ficando vermelho e depois escuro. Uma lua cheia nasceu.

Índio 2 : A profecia fala de um país distante. Era um mistério, pois sabemos que Pindorama está sozinho no mundo e no céu. A profecia falava do país de Portocal.

Rodriwin: ( começou a cantar , logo acompanhado de todos)

Saco, saco, copa , copa
Ipa, ipa, opa, opa
Pindo, pindo, rama, rama
Pindo, pindo, rama, rama
Quando vem de Portocal
Portocal, Portocal
É muito mau
Quanto mais mau
Mau, mau ,mau
Rodriwin e Dragão-mãe voltam lentamente para a lagoa mergulham desaparecendo. Todos os índios ficam estáticos cantando. Escurece pouco a pouco.

Cena 2
Mesma cena. Muitos índios, índias e curumins tratam dos seus afazeres diários. Repentinamente entra um homem branco de grandes barbas, de chapéu de plumas, arcabuz e espada. Entram muitos mais. Ficam estáticos. A cada um que entra um dos índios cai morto, até que a cena se enche de aparatosos colonizadores.Um grupo de índios tenta resistir, mas caem ao levantarem as bordunas. Os índios e curumins caem todos. Sobram algumas índias que continuam a tratar dos seus afazeres, cantando:

Porto , porto, cale, cale
Porto, porto, cale , cale
Pindo, pindo, rama, rama

Os homens brancos dançam e cantam cercando as índias

Porto, porto, cale, cale
Pindo, pindo, rama , rama
Bra, bra, sil , sil
Bra, bra, sil, sil.
Pindo, pindo, bra, bra
Sil, sil, sil

Rodriwin e Dragão-mãe saem da lagoa soltando fogo. Os homens brancos fogem levando as índias.

Escurece. Cortina

Terceiro Ato
Cena 1
As margens da lagoa, porém com uma rua e casas e um pequeno prédio onde se vê um cartaz: Bar Berlim. As portas de vidro do bar estão quebradas. Uma praia . Um menino sentado na areia pensativo. No alto do Corcovado a estátua do Cristo. Um barco a remo, com outros meninos passa e desaparece. Ainda se ouve o mesmo canto do final da Cena 2 do Segundo Ato. Na lagoa aparece a cabeça de Rodriwin aproximando-se da praia.

Rodriwin: O que você está pensando ?

Olavinho: Estava pensando porque nunca paramos de pensar. Você é igual aos dragões que aparecem nos meus sonhos. Porque não paramos nunca de sonhar quando dormimos ?

Rodriwin: Acordaram-me com uma gritaria , berros e vidros quebrados.

Olavinho: ( aponta para o bar ) Quebraram tudo. Foram os mais velhos.

Rodriwin: ( sentando-se ao lado do menino e dando baforadas de fumaça)
Porque ?

Olavinho: Meu pai contou-me que os tais de alemães afundaram navios de Pindorama. O dono do bar é alemão. Escondeu-se quando a turma quebrou tudo.

Rodriwin: Eu tenho um segredo que vou contar só para você. Tenho voado e nadado pelo mar. Além da ilha branca. Tenho visto muitos navios que andam debaixo dágua. Por trás das ilhas os marinheiros louros tomaram banho de mar muitas vezes. Várias vezes soltei muito fogo e queimei-os, explodi os navios. Minha mãe me contou que foram homens louros que mataram meu avô e meu pai. Mas menino, tenho que tratar de outro assunto muito sério. Tenho notado que você é muito tímido. Todos vem jogar futebol aqui na areia. Você fica sentado no portão de sua casa. Grudado no degráu. Sem coragem para atravessar a rua e pedir para jogar.

Olavinho: Tenho certeza que nunca atravessarei a rua. Gosto de ficar sozinho pensando em dragões . Sabia que encontraria um de verdade como você. ( fica de pé e começa a dar pulos). Você sabia que o Fluminense foi campeão no ano em que nasci. Foi bi-campeão. Foi tri –campeão no ano seguinte. Quando os homens louros que você viu no mar começaram uma guerra num mundo mais velho, muito longe daqui.

Rodriwin: Foi de lá que vim com minha mãe. Foi de lá que vieram os homens que mataram todos os índios que viviam em volta desta lagoa.

Uma voz chama o menino com insistência. Logo depois uma babá jovem , negra e bonita entra . Como se não visse Rodriwin, pega o menino pela mão e leva-o .

Babá: Aposto que você está conversando com esse tal de dragão Rodrigo que não sai da sua cabeça.

Rodriwin deita-se de costas, solta uma boa baforada de fumaça, passa , carinhosamente, a ponta da cauda na cabeça do menino. Sai voando.

Olavinho: ( para a Babá) Um dia vou lhe apresentar ao Rodriwin.

Babá: Como você inventa histórias ! É seu tio que põe essas coisas na sua cabeça.

Olavinho: Um dia vou para lua com ele. Já comprou passagens para nós dois. Rodrigo não precisa de passagem. Vai com a gente voando e protegendo o foguete.

Olavinho e a Babá saem. A Babá canta o samba “ Trabalhar eu não , eu não...” Entram outros meninos, índios, índias, mascarados, piratas, baianas, damas antigas, odaliscas, pierrôs, colombinas, uma banda inteira tocando o samba. Rodriwin ou Rodrigo estica o pescoço para fora dágua e canta também.

Rodriwin: ( Soltando fogo e tentando chamar a atenção ) Eu estou aqui !! Estou aqui !! Não tem jeito . Só o Olavinho consegue me ver.


Cortina

FIM

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